domingo, 23 de março de 2014

Fica

-Fica!
Eles se olharam desesperados. O movimento dos carros na rua era perturbador. O mundo parecia-lhes girar ao redor, incessante. Por um segundo que seus olhares cruzaram, a raiva se juntou à uma vontade incontrolável de chorar e se render ao pedido choroso. Como pode uma palavra tão pequena anular o que havia acontecido e o que tinha sido dito?
-Fica!
A voz repetiu, já trêmula, porem resistente ao choro e indiferente à multidão que passava na calçada.
Os olhos se mantiveram, sem piscar por uma eternidade, ou alguns segundos. Ninguém se importou com o tempo naquele momento. Só havia duas mentes vazias, dois pares de olhos se encarando, dois corações machucados e uma palavra:
-Fica!
Naquele instante um dos ouvidos reconhecera que aquelas batidas eram seu coração pulsando, tentando dizer alguma coisa.
Enquanto isso, no outro corpo, faltava o ar. Pulmões ofegantes tentavam movimentar um ser intacto.
Tanto faz quem disse, quem ouviu, quem machucou, quem partiu. Havia uma palavra solta, perdida, esperando uma reação.
Viu-se um passo, sentiu-se um abraço.
-Fico!